domingo, 17 de agosto de 2025

A foto incompleta

Hoje a mesa se vestiu de festa.

Panelas tilintaram como instrumentos de uma orquestra,

e Adriano, maestro do fogão, temperou cada detalhe

com pitadas generosas de amor.

Entre garfadas e risadas, o domingo ganhou cor,

ganhou cheiro de feijão tropeiro,

ganhou abraços e olhares cúmplices.

A cada brinde, um pedacinho de felicidade.

Mas o coração, esse companheiro silencioso,

guardava também um nó.

Ao abrir o vinho, a taça vazia me lembrou:

faltava alguém para brindar.

E mesmo no riso, a saudade soprava sua melodia.

Eu, que sempre gosto de guardar memórias,

me escondi atrás de fotos tímidas,

como quem diz: “Estou aqui, presente,

mesmo quando meu peito insiste em viajar no tempo.”

De repente, o clique esperado:

Adriano, seus pais, minha mãe… e eu.

Mas cadê ele?

Naquele instante, éramos cinco,

quando o coração gritava seis.

Sorri pequeno, segurei o choro,

e percebi que a ausência também aparece na foto,

mesmo quando não vemos o rosto.

E o consolo veio como um sopro:

um dia já existiu a foto completa,

a foto dos seis.

E isso ninguém me tira.